não sei se preguiçoso ou se covarde

carrego marcas e malas
e ainda assusto quando
me deparo com esse tal
sentimento que mata
e chamamos amor...

contém e está contido

e quando eu criava, dentro de mim, toda a certeza do mundo, acontecia um ato simples, como um tremor de terra de grau um, involuntário a mim e desmoronava com todas aquelas provas, quase palpáveis e que continham, até então, as projeções perfeitas das minhas paranóias, carregadas é claro, de toda lógica...
tem cura?

alberto caeiro

"quando vier a primavera,
se eu já estiver morto,
as flores florirão da mesma maneira
e as árvores não serão menos verdes que na primavera passada.
a realidade não precisa de mim.
sinto uma alegria enorme
ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma.


se soubesse que amanhã morria
e a primavera era depois de amanhã,
morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
e gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
por isso, se morrer agora, morro contente,
porque tudo é real e tudo está certo.

podem rezar latim sobre o meu caixão, se quiserem.
se quiserem, podem dançar e cantar à roda dele.
não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
o que for, quando for, é que será o que é."

a poesia não é interessante, ela é essencial...

oh fardo largo e ilusório!
como achar que nós,
simples palavras,
carregamos a essência das coisas...

a(c)alma

não quero o dever de uma promessa,
o que me interessa é involuntário.

paulo leminski

"poetas velhos 

bom dia, poetas velhos.
me deixem na boca
o gosto dos versos
mais fortes que não farei.

dia vai vir que os saiba

tão bem que vos cite
como quem tê-los
um tanto feito também,
acredite."

agora

...deixar de ser tudo que você foi ... ser o que você ainda não é...

não existe essa coisa de momento errado

estou dando pequenos passos
com apoio de pequenos braços,
os pés um pouco bambos,
estão em cima de bases firmes.
andando junto ao destino,
numa teia de mãos entrelaçadas,
estou aqui e preciso sim, de ti.

lembre-se que eu faço parte do seu exército...


raio de sol

o relógio parado,
a pilha descarregada,
os ponteiros não se movimentam,
não há hora, minutos nem segundos.

a luz apagada,
a lâmpada queimada,
o quarto está escuro,
não há luz, sombras nem brilhos.

é o sol que baixou
seu esplendor em pôr,
e o vento fraco
despede-se
passando
e não voltando.

sinais

meu coração bate forte, agora.
minha respiração profunda, dura.
pulso, encho e esvazio...
intenso trabalho peitoral,
dos dois lados - o ar,
no meio - a falta dele.

passos largos

eu vi o seu pé e não reconheci
as curvas, os dedos, o peito nem a sola.

naquele pé só,
não te vi, no ir e vir, não me vi.

as fronteiras ultrapassadas,
os passos entrelaçados,
alguns em falso, outros tropeços.

nossos rastros, deixados de lado,
misturaram-se a outros passos,
viraram pé, pó.
 
saudade de passos juntos,
passadas, passado,
ter dois pés...

é por isso que eu...

não há onde agarrar,
só vejo fumaça ao meu redor,
estou tateando o ar,
sentindo a dor do mundo...

remando

nos telhados das árvores,
um pássaro do asfalto.

anos luz

não vou dar marcha ré porque estou de banguela na ladeira.

você quer provas?

eu também.

carlos drummond de andrade

o seu santo nome

não facilite com a palavra amor.
não a jogue no espaço, bolha de sabão.
não se inebrie com o seu engalanado som.
não a empregue sem razão acima de toda razão (e é raro).
não brinque, não experimente, não cometa a loucura sem remissão de espalhar aos quatro ventos do mundo essa palavra que é toda sigilo e nudez, perfeição e exílio na Terra.
não a pronuncie.

relacionamento ou negócio?

é porque não adianta você querer demais, para funcionar, é preciso que você seja demais. como uma parte essencial pro movimento, que gera contribuição. se não, ficarás à contemplar de um mesmo ponto, indeterminadamente, até que caia um raio em sua cabeça e transforme em cinzas, um sol que nunca brilhou. a faísca que gera uma única chama, justamente, no ato da libertação, a morte. que essa resistencia seja pra outros fins, no relacionamento interpessoal, a melhor opção é ser sentimental.

carlos drummond de andrade

o pleno e o vazio

oh se me lembro e quanto.
e se não me lembrasse?
outra seria minh'alma,
bem diversa minha face.

oh como esqueço e quanto.
e se não esquecesse?
seria homem-espanto,
ambulando sem cabeça.

oh como esqueço e lembro,
como lembro e esqueço
em correntezas iguais
e simultâneos enlaces.
mas como posso, no fim,
recompor os meus disfarces?

que caixa esquisita guarda
em mim sua névoa e cinza,
seu patrimônio de chamas,
enquanto a vida confere
seu limite, e cada hora
é uma hora devida
no balanço da memória
que chora e que ri, partida?

gênese

me olhei no espelho,
reconheci no olhos, nos cabelos, nos sonhos.
e depois de muitos murros no peito e lágrimas no rosto,
me vi como um elo, eu sou o elo!
sem traições nem rompimentos, eu vou até o fim...
e continuarei, sendo, até o fim...

vou mergulhar

e depois, de ver a lua brilhar alta,
vejo agora, o sol irradiar atrás das nuvens.
daqui de baixo,
nessa chuva de lágrimas,
entre o frio e a brasa,
vou sem asas, e pra que?
já sei nadar...

sebastião da gama

"sorri, sorriste. o mundo era pequeno. mas bastava. cabia nele, intacto, o encantamento pleno que te detinha ali, junto de mim, que nos detinha ali, serenos, puros, longe da multidão, longe do tempo - rio que passava ao largo e nós ficávamos."

querendo ser demais, eu fui de menos

uma super produção de si mesmo, e eu aqui, com esse rabisco em branco e preto.

...y que sea lo que sea...

um temporal caindo,
ora água ora granizo,
e eu me molhando,
com o guarda chuva quebrado,
deixando-me molhar.

um tonto

parei de beber
e saio pra bares 
mais vezes que antes.
vez por outra,
ao redor das mesas,
procuro acompanhar o ritmo,
que muitas vezes desentoo
e faço graça pra reparar,
não passo de um chato.
tento envolver meus camaradas,
com as voltas da sobriedade,
quero agradar os tontos alegres
e eles vão pra outro lado,
fingindo não ouvir,
o meu papo chato.
sozinho na mesa,
não raro quero um trago
e bebo escondido de mim,
essa maldita cachaça,
que me deixa enjoado.
ao fundo da garrafa vou,
e agora já sou trapo,
são tantos papos, tontos sapos
e o tonto chato papa tanto,
que os tontos alegres voltam
e fingem perceber,
que a garrafa está ali
e eu não.

samambaia

sim, eu sou forte,
luto e saio no tapa se preciso
for.
mas é que, ando meio caído
e pelos cantos me sentindo confortável.
deve ser aquela vontade,
de admirar mais do que atuar,
ser planta sem flor, sabe?

carlos drummond de andrade (1942)

"lutar com palavras é a luta mais vã. entanto lutamos mal rompe a manhã. são muitas, eu pouco. algumas, tão fortes como o javali. não me julgo louco. se o fosse, teria poder de encantá-las. mas lúcido e frio, apareço e tento apanhar algumas para o meu sustento num dia de vida. deixam-se enlaçar, tontas à carícia e súbito fogem e não há ameaça e nem sevícia que as traga de novo ao centro da praça."

(re)encontros

conhecer alguem é conhecer-se, construir.
simpatizar com alguem é reconhecer-se, reconstruir.
compartilhar, redescobrindo detalhes e, a partir do lembrado, ser o que já se é.
uma explicação pros que procuram, isso é amor e qualquer semelhança com a realidade, é pura ilusão de ótica.
atenção, quando acordar, não se iluda.

aquela antiga dedicatória...

um presente velho como o sentimento.
perdeu o brilho, desgastou a capa,
amassou e amarelou as páginas,
amargou e apagou as palavras.
nem por isso está morto,
é velho e vivo, ainda vivo.
o presente pulsa, pulsa o presente.

envolvimento

que o dom de compartilhar,
se espalhe feito poeira.
corra os céus,
entre nos pulmões,
inspire os corações,
cause emoções,
crie espirros
e transforme
solidão em união
e solução.

a paz

há de haver um dia se quer,
que as sensações que saciam os desejos,
durem mais que um simples momento.
e nesse dia, o meu maior desejo
será estar acolhida em seu peito!

fraqueza?

jamais confunda educação e gentileza com fraqueza.

joão braz

"cruzar os braços - não!
antes erguê-los para o céu
no gesto inútil de agarrar estrelas!

antes abaixá-los, amparando neles
os que tombam, varados pela dor;
antes de abrí-los para um possível
e fraterno abraço ao mundo
e acolher todos os oprimidos,
todos os deserdados e todos os famintos
de todos os cantos da terra!

tudo - menos cruzar os braços
indiferentes e inúteis
para a necessidade de construir
o novo mundo que há de vir
justificar os sonhos dos poetas
e as lutas dos iluminados
que morrem por uma idéia!"

você achou que sairia ileso dessa, caro poeta?

incrivelmente acordei, hoje, mais leve,
aquele peso que carregava até ontem,
que não era meu,
foi devolvido ao seu devido lugar.
carrego agora,
dentro da mochila em minhas costas,
as coisas e os desejos,
que mais tenho apreço.
e é tudo que preciso,
nada mais.

realidade é superfície

eu não tenho pressa,
estou serena à bessa,
nesse dia que acelera.
ele pede intensidade
e eu faço cera,
ao sabor do vento.
tempo amigo,
ando tentando,
entender seus momentos.

para que tanta luta?

é incrível, a capacidade que as pessoas tem de transferir a culpa que sentem. deve ser da natureza humana, o ato da covardia. é mais fácil, porém, não mais simples, colocar a culpa no sistema, no todo, amortecendo a potencialidade do indivíduo. De que vale tentarmos, todos os momentos, sermos notados por nossas diferentes características, se quando a hora da revelação chega, ou seja, da sua expressão, o ato da covardia é a saída mais usada.

conversa de liquidificador

masoquismo? sentimento de inferioridade? carência? mutilação? é muito cruel, não tenho mais forças pra seguir nessa guerra perdida, entrego minhas armas, meus sonhos, meus carinhos, minhas incertezas, meus desejos, minha esperança e não quero mais beijos e nem versos. não vejo opções nem soluções nem caminhos, nada pra mim. é difícil compreentender o escuro, que é claro aos meus olhos. preparo-me para mais uma guerra interior, na qual, precisarei vencer para viver melhor. fazer das lágrimas ensinamentos e guardar na memória pra não esquecer o sofrimento. eu choro, como a muito tempo não fazia, aliviando meu peito dolorido, que está cheio e cansado. "se você não pode ser forte, seja pelo menos humana". desista. me ajuda?

se eu ajudar, pode ser que desista também, às voltas das ondas emotivas e concordante com os lamentos. assim, seremos dois desistentes, que abandonam o barco na metade do caminho, quer dizer, em alguma parte do caminho. seres humanos carregando o peso da culpa em suas pernas."todo mundo é parecido quando sente dor"?

o que acabou de acontecer foi um tropeço, um profundo lamento, que lentamente transcorreu. o caminho calçado, foi passeado por pés, também calçados, com botinas de solados duros. difícil é lembrar e compreender que o tempo estica e o espaço ocupado é consequência e sentença. és responsável por tudo aquilo,"mas, quem tem coragem de ouvir?"  

você achou que seria fácil? resolvendo com a agilidade de uma lebre, dizendo que seria mole e de tão mole, que foi,  confundiu os olhares, surpreendeu os envolvidos e empoeirou os passos dados. houve um convencimento momentâneo, num apático seguir. a mais fácil e óbvia, a que estava escancarada. à que mais brilhava. já não era necessário, naquele momento, para você, "ouvir amanhecer o pensamento."  

no depósito

eu guardo
segredo
lembrança
desejo

eu guardo
no peito
no sonho
no jeito

eu guardo
pra mim
pra você
pra gente

eu guardo
porquê?
pra quando?
até quando?

segredo no peito pra mim, porquê?
lembrança no sonho pra você, pra quando?
desejo no jeito pra gente, até quando?
eu guardo, eu guardo, eu guardo, eu guardo

melancolia

um constante medo
de escolher,
do que ser,
de ser quem não sou,
de ser quem eu fui.

circunstanciais fugas para um esconderijo interior,
buscando fundo o que não consegue ser livre.
lendo e escutando pra sentir bem fundo
e descobrir alguma coisa, que, ainda emocione.
ironias de um coração que já não chora
e vive a fugir de um possível naufrágio.

sem anéis

pra saber qual direção,
não quero ouvir perguntas,
estou sem respostas pra ocasião.
fazer as coisas certas,
é caretice que não presta,
e surpreende o rebelde.
joga-o pela terra,
iguala-o aos demais,
numa briga de foices,
onde cabeças vão rolar.
o clichê comprova um fato,
que o revolucionário não quer ver,
é o sentimento de conforto,
que alerta de outrora,
hoje toca moda de viola,
numa casa no campo.
assiste como um santo,
vê a guerra do alto da serra
e o impulso de se atirar,
já não faz movimentar.
esse saturno volta e faz,
a balança bambiar,
num instante é o sim,
logo mais, o não também.
e, para os que gritam por conforto,
a liberdade é pra outros gostos.
essa esfera escorregadia,
sem aneis pra apoiar,
suas garras vai solicitar.
e o caminho trilhado,
as marcas vão mostrar,
depois que retornar,
enxergar e decidir,
o que te faz feliz.

socorridos os susurros, os desejos são novamente comprimidos...

meu olhar que olha hoje, olhou ontem também, e era seu.
meus suspiros que agora arrepiam, em outro segundo arrepiarão também, e serão seus.
letras riscam minhas dores e lamentos,
e as suas, sinonimas palavras, 
riscam semelhantes desejos.
diferenças sutis na maneira de pedir socorro.
magia de ser quem não se é e estar quando não se é chamado.
movimentos, da vontade que circula, com leviandade,
levados artifícios, que confundem as intenções
e não tem mais peso, já estão no coração.
está na cara e no verso que são versões gêmeas,
siamesas por um lado, antagonicas por outro.

... preciso de àgua.

o tempo atual

vendo meus dias passarem tão rápidos,
que já nem sei que dia é...
já nem sei se quero,
ou se não quero,
eu apenas vou.
quando não há tempo pra sentimentalismo,
a essência é que encoraja.

ainda, há espaço para o amor?

sexo sem compromisso,
amor sem grilo,
e o coração?
bate forte.

a beleza de ser o que é

você esta sem vaidade!
achas?
sim, antes se cuidava mais, se arrumava mais, era mais bonita.

passando a limpo

tem muito rascunho nessa merda,
pouca página concluída.
muito a ser dito,
pouco saco de dizer.

sai daí

me tira de casa,
me leva pra sua cama,
pra que eu esqueça
que a vida não é mole
e que eu to dura.

ele é fugitivo, ele é fugitivo!

tem medo que toquem o seu coração,
corre... pega o fujão, pega a fujão!

meu corpo involuntário de mim

eu não estou, mais, aqui.
estou invisível,
não exalo calor,
não coloro o ambiente,
meu tempo, aqui, acabou.
minha mente vaga em outros cantos,
e agora, neste canto não caibo mais,
o encantamento canta noutros, e(n)cantará.

delia steinberg guzmán

"o coração

os antigos egípcios explicavam que os mistérios se intuem ou se percebem com o coração, esse coração especial que constitui a alma humana. extraí do livro o mundo mágico do antigo egito, de christian jacq, as seguintes palavras: "...o centro das percepções mais finas é o coração. não é o orgão em si, mas o centro imaterial do ser..."
o coração nos permite sentir unidos com a natureza inteira, com todos os seres, e perceber uma mesma energia em tudo e em todos, ainda que adaptada às diferentes formas e circunstâncias. deste modo, é mais simples entrar em contato com o próprio espírito, com deus, e romper as terríveis barreiras que, a partir da mente, separam a vida da morte. a energia é uma só, e permanente."

ana paula maia

"na literatura, ou em qualquer outra arte, só se faz o que pode, não o que quer. caso contrário, teríamos vários machados e guimarães."

a(c)alma

eu quero a calma dos cansados
e os suspiros dos que dormem. 
é a pausa que me interessa!

vontade

ideia que atormenta,
desejo que enlouquece,
doença que domina,
impulso que...
por vezes realiza, noutras não.

sem danos permanentes

incrível essa capacidade de entender,
ou, pelo menos, tentar compreender o outro,
qualidade bonita de ver, de ter...
a tríplice aliança começa e se formar,
entre eu, você e nós.
o raro começa a florescer em nossos peitos,
a chuva alimenta e o sol faz crescer,
brilhando o reflexo de um no outro.
como é bom misturar temperos,
carregar de verdade a voz,
acompanhar o olhar, 
suspirar ao toque,
arranhar o ar com gargalhadas emolduradas por aspas.
emocionar-se com retribuições, inundamento...
dançar na cadência de um rock'roll progressivo,
em um palco romantizado com orquestra sinfônica.
filmamos nossas cenas, encenamos bobos,
querendo o querer, compartilhamo-nos.
com o risco displicente de deixar-nos seduzir.

a equilibrista

na janela,
venta forte,
muito forte,
venta...

o marinheiro solitário

nesse dia branco,
de céu nublado 
e mar mexido,
as ondas estão caudalosas.
o barco ao mar,
sobe e desce
e a carcaça encouraçada,
fura em cada sequência, as sete ondas.
o porto não vejo,
as nuvens nebulosas encobrem minha visão,
uso a intuição cadênciada pelo mar,
para guiar. 
meus suspiros vem da paz de seguir
e o medo é a impulsão,
em alto mar é preciso precaução!
o timão em minhas mãos,
eu movo concentrado no silêncio,
que vem do interior.
a embarcação,
segue o rumo
e concebe o mundo,
e eu, pulso...

não ache

sozinha sou uma,
com você sou outra,
e assim por diante.
não que eu seja reativa,
não serei,
nem terei sido,
quando quiseres.
estarei quando me convir,
e serei sempre,
uma pausa do que construí.
quando estivermos num ato,
não será falho,
nem trocável,
terá sido.
não adianta querer,
não me conheces para isso.

brincar

e se esse for o caso,
de fugir do acaso,
talvez seja fácil.
estar em um laço,
com mil voltas de embaraço,
sem saber qual próximo passo.
insegurança de seguir,
como quando se viaja,
pra um horizonte nunca avistado.
a instiga movimenta
os anseios resgatados,
molha a terra,
cuida do nada,
pra que se faça notado.
o atrevimento partilha,
o que nem sequer existe,
e tem força realizável.
uma pausa de mil compassos,
faz do caminho, vida toda.

um tributo ao amor

"é preciso sofrer depois de haver sofrido,
e amar, e mais amar, depois de haver amado."
guimarães passos

"amor é o rio claro das delícias que atravessa o deserto, a veiga, o prado, e o mundo todo tem!
que importa ao viajor que a sede abrasa, que quer banhar-se nessas águas claras, ser aqui ou além?"
cassimiro de abreu

"amor é vida; é ter constantemente
alma, sentidos, coração - abertos
ao grande, ao belo; é ser capaz de extremos,
de altas virtudes, té capaz de crimes!
compreender o infinito, a imensidade
e a natureza e Deus; gostar dos campos;
de aves, flores, murmúrios solitários;
buscar tristeza, a soledade, o êrmo,
e ter o coração em riso e festa;
e à branda festa e ao riso da nossa alma
fontes de pranto intercalar sem custo;
conhecer o prazer e a desventura
no mesmo tempo, e ser no mesmo ponto
o ditoso, o missérrimo dos entes:
isso é amor, e desse amor se morre!"
gonçalves dias

"o melhor dos amores dura um dia
ou pouco mais; neste pequeno espaço
todo ele cabe, todo se irradia
sem tristezas, sem pausas, sem cansaço."
alberto de oliveira

"o amor faz monossílabicos; não gasta
o tempo com análises compridas;
nem é próprio de boca amante e casta
um chuveiro de frases estendidas;
um volver d'olhos lânguidos nos basta
a conhecer as chamas comprimidas;
coração que discorre e faz estilo
tem as chaves por dentro e está tranquilo."
machado de assis

"quem ama traz no peito uma ferida;
nem sempre o amor é rosa de vergel;
quem ama sabe quanto custa a vida!"
tomaz lopes

"fechar ao mal de amor nossa alma adormecida
é dormir sem sonhar, é viver sem ter vida."
menotti del pícchia

"meu amor, este amor que me mata,
de minha'alma no seio profundo,
traduzindo o silêncio dos astros,
encerrando a grandeza do mundo,
- é o orgulho da vaga empolada,
que se julga mais rica e ditosa
de embalar uma lágrima d'anjo
no batel de uma folha de rosa."
tobias barreto

"tu, só tu, puro amor, despir pudeste
de estúpida bruteza a humana espécie;
só tu soubeste unir em firmes laços
os dispersos humanos!"
souza caldas

"quem ama sempre, um dia
deixa de ser amado;
somente o amor que foge
não é abandonado..."
vicente de carvalho

tô no páreo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

a cada passo, alvoreço
a cada alvorecer, desperto
a cada despertar, peleio
a cada pelear, descubro
a cada descoberta, venço
a cada vitória, inspiro
a cada inspiração, broto
a cada broto, escolho
a cada escolha, movimento
a cada movimento, caio
a cada caída, derrota
a cada derrota, perco
a cada perda, choro
a cada choro, sofro 
a cada sofrimento, peço
a cada pedido, chove
a cada chuva, enlouqueço
a cada loucura, crio
a cada criação, expiro
a cada expiração, creio
a cada crença, recompensa
a cada recompensa, sonho
a cada sonho, transformo
a cada transformação, monto
a cada montagem, construo
a cada construção, desvio
a cada desvio, realizo
a cada realização, estou
a cada estar, avanço
a cada avanço, crepúsculo
a cada crepúsculo, um passo...

a sete chaves

sempre, quando desço ao porão, remexo em baús esquecidos. há muito tempo sem serem tocados. com sopros cautelosos, o pó que esconde o que existe, vai misturando-se ao ar. nuvens revelam formas e volumes, memórias palpáveis. enxergo os baús e ao toque, sinto-os parte de mim. revivo-os.

nesse caminho

eu andava calmamente, quando avistei um gato que andava na mesma rua. andávamos em sentidos contrários, um ao encontro do outro. direções opostas convergindo para um ponto comum, numa perspectiva oblíqua. íamos distraídos até percebermos que o encontro ocorreria, por isso, começamos a nos observar, mutuamante, olhos nos olhos. a cada passo, um suspiro profundo, do fundo e o encontro mais próximo e o caminho mais curto, e os olhares, fixos. foi quando, num impulso, ele, resolveu desviar seu caminho, atravessando o meu, que pela pouca distância, já era nosso. hesitei por um segundo, mas, sem pausa continuei o caminho atravessado, carregando a partir desse momento o coração na mão, que continuava sendo meu, mas, não era mais nosso - o caminho. alguns passos a frente, um transeunte que observou aquele momento, chamou minha atenção e alertou-me assim, assim dizendo: você viu isso? um gato preto atravessou o seu caminho, cuidado!

um hobbie que ninguem pode ver!

tento entender os meus limites, os seus limites.
busco respostas pra minhas dúvidas, pra suas dúvidas.
interpreto cada impulso meu, cada impulso seu.
deixo símbolos e encontro símbolos deixados.
baixo a guarda pra mostrar e pra ver.
em momentos que estou, sou e quando estás, és.
compromisso velado, sem tinta nem pinta.
em flagrante, autuado.

trecho do livro não apresse o rio, ele corre sozinho por barry stevens

"a luz do meu abajur brilha sobre a máquina de escrever, um brilho azulado, que some no escuro quando se afasta da lâmpada. a sombra do carro da máquina move-se para esse escuro, e depois foge. a luzinha quadrada que mostra que o motor está funcionando (como se eu não pudesse ouvi-lo - e mesmo que não tivesse ouvidos, posso sentir as vibrações) é cor de laranja forte, mais berrante do que a própria máquina. mãos tocando teclas. quando noto esse toque, as minhas mãos ficam mais suaves do que estavam, mais gentis, usando apenas a pressão necessária para acionar as teclas, e não mais, e assim não há reação contra mim mesma. parece mais uma música. eu me sinto em harmonia. até mesmo as batidas das teclas contra o rolo parecem mais macias quando eu amoleço, menos resistentes. a ondulação que passa pelo meu corpo e pelo meu rosto é algo que se faz sentir como riso - não riso forte -, um riso suave, como uma pluma. eu sou o meu próprio fazer."

andré di bernardi

"foi por pouco,
foi só um passo,
e já era pássaro."

você não consegue caminhar com suas próprias mãos?


lazy girl, easy girl

perda de tempo, sofrimento.
desafio do querer ser, entorpecer.
reflexos que dizem,
leitura de símbolos,
despertares.
sinais que brotam,
cultivo de sementes,
possibilidades.
é bem diferente de realidade!

quero ser flor, ter cor, ter cheiro, ter toque...

no meu mundo onírico, sou princesa!
aquela rainha antepassada, me pede sempre, pra parar de voar.
eu tento escutá-la e entristecida, desisto de amar.
e viver desse jeito,
sem saltos no ar,
seria a morte,
pra quem só sabe boiar!

talvez, esse seja o momento

eu gosto de unanimidades,
mas a unanimidade é burra.
aja duas vezes antes de pensar,
eu gosto do que é burro.
pela peneira dos pensamentos,
perdeu-se o sentimento.
virou individualização,
desunanimizou,
humanizou.

não busco mais

me vi no reflexo e não gostei, referencias perdidas.
no meu espelho inconsciente, me revelei em atos falhos.
repetição e incorporação, do mau querer.
força invisível de ecos de eus, não meus.
ilusão e incompreensão, identidades.

lentidão

na verdade, é tudo uma farsa, que eu percebi agora, depois dessa overdose de marmelada.
as verdades se misturam e os motivos se traem, e eu percebi somente hoje, depois dessa overdose de bananada.

here's the story of the hurricane

a música empolgante
e um intenso astral,
no ar impregnado.
as mãos balançam como ondas,
a liberdade corre nas veias,
e no vento da janela.
a comunicação começa,
os braços conversam,
como furacão.
rasgada a fio de seda,
a palavra engasgada é libertada.
brilha! assusta! inunda!
faces chocadas seguem para a direita,
faces chocadas seguem para a esquerda.
para os dois lados, partes, de uma ação conjunta,
partilhada no ar, no corredor sugador.
tornado torna, um ato, libertador!

cecília meireles

"não tem mais lar para o que mora em tudo.
não há mais dádivas
para o que não tem mãos.
não há mundos nem caminhos
para o que é maior que os caminhos 

e os mundos.
não há mais nada além de ti.
porque te dispersaste…
circulas em todas as vidas
pairas sobre todas as coisas 

e todos te sentem
sentem-te como a si mesmos 

e não sabem falar de ti."

foi assim

não quero ser o que não sou.
procuro ser o que não sei.
tudo perdeu o sentido,
havia alguem?
só os publicaveis merecem ser vistos,
se é que me entende?
amanhã tudo será vertigem...
tudo aquém.

a única

essa é a minha verdade: eu nunca quiz!
por favor, acredite, sou eu quem diz!

meu querido diário

hoje, transei com um desodorante.
foi ótimo, mas, depois que gosei, joguei-o pela janela.
afinal, melhor um pau voando do que dois na boca.

o estrangeiro

há algum tempo, venho me sentindo sem casa, como um cidadão do mundo, e com isso, sinto uma saudade que eu não sei dizer de onde é. uma vontade que eu não sei de quê. penso, que pode ser de uma sensação de segurança, proteção, de amor. desde muito pequeno sinto uma esquisita sensação. é uma vontade que vem do fundo do peito e que me faz, sempre, querer ir além de onde estou, de romper fronteiras. essa vontade cresce a cada dia, sem parar. há momentos, que ela toma forma e força e consegue me levar pela mão por caminhos desconhecidos. dentro do mundo, identifiquei meu papel, e ele é solitário. vendo as imagens e símbolos coletivos produzidos, sinto uma certa vontade de participar, de estar envolvido nesse meio, mas, como meu papel de clandestino foi escolhido, e é ele mesmo o que eu quero. seguirei em frente, à margem. perdido en el corazón, de la grande babylon.