renovar-se-á

um reflexo do que já foi, do que ainda é e também do que será
uma nova imagem velha, renovada entre si, misturada, confundindo-se
novas utilidades para velhos reflexos, numa abstração de velhos em novos
ecos

uma conversa dura

de frente pra ela, a parede
eu olhava e ela me olhava
expressávamos-nos, entendíamos-nos
mas tinha uma coisa que era incompreensível
pra mim e pra ela
uma dúvida
quiçá eterna

sobras

sobra aqui, sobra ali
sobra lá, sobra aculá
pra todos os lados
onde derramar o caldo?

o pensamento e a palavra

semelhantes, os motivos
longos, os caminhos
os atalhos confusos.
muitas tentativas
poucas conquistas
num salão de estudantina.
de tantos que eram
de tantas que eram
perderem-se na dança
ele e ela.

era apenas um guarda chuva...

a chuva chegou e eu saí, branda, eu e a chuva. pra lá e pra cá, íamos até encontrar o abrigo, eu e meu guada-chuva. chegamos, susto à primeira vista, tudo estava bem diferente. dúvida, estou no lugar certo? fui convencida que sim, aproveitá-lo-ei, então. guardado ali, embaixo da pia, ficou o meu guarda-chuva. a chuva que era branda virou tempestade junto comigo, respirei pedindo calma, e ela devagar devastou, molhou, até que acabou. o tempo passou e eu já podia ir embora e foi o que fiz, porém, embaixo da pia ficou o meu guarda chuva, sem eu perceber. me lembrei quando já estava longe, e agora? busco outro dia, pensei. mas talvez pela falta de necessidade daquele momento, que ja fazia sol, não consegui tê-lo de volta. mas tudo bem, era apenas um guarda-chuva...

e mais uma vez ela se refugiou no cinema...

chegavam horas em que ela não queria mais procurar nem achar, estava cansada e desiludida. o que ela queria parecia impossível, não entendia, porque simples parecia. chegava a pensar que no mundo só ela procurava por isso, como se seguisse contra o fluxo. faltava-lhe força e ânimo. por ser mulher, muitas vezes se iludia e alimentava suas fantasias, aproveitando sem pudores ou jogos de guerra, paz ela queria. facilmente se envolvia, pra ela era simples, fluia, e se fluia era bom, não precisava de freios. nesses momentos não se arrependia das ilusões, mas saudade também não sentia, porque estava agradecida. não era culpa sua, ela sabia, pois tentava sempre, mas nesses momentos, desistia.

espelho

de frente pra você
olhando e tentando ver
mas quando está só eu e você
me poupe de ter que dizer
não precisa esconder

do manual da cabeça maluca

atenção!
não se iluda

monolito

silêncio

joão de deus

"a vida é o dia de hoje,
a vida é ai que mau soa,
a vida é sombra que foge,
a vida é nuvem que voa.
a vida é sonho tão leve,
que se desfaz como a neve
e como o fumo se esvai;
a vida dura um momento,
mais leve que o pensamento..."

definitivamente, não são os números

perfil matemático
personalidade moldada
individualidade gritante
prova
trinta minutos
pense rápido
dados lógicos, ou não
resultado
4 = 0
reprovação
tchau
até amanhã
no mundo dos sonhos
dados lógicos não, ou sim

do nada ao nada

vem mais
esforço, dedicação, desafios, escolhas, percurso...
pra, após longo tempo, longa jornada, inúmeras ações dramáticas
uma alegria, mesmo que efêmera
após uma sessão
um mergulho
o fim

a hora da estrela (diálogo do filme dirigido por susana amaral com roteiro baseado no livro de clarice lispector)

"olímpico
- eu uso a palavra cafetina porque não tenho medo das palavras. você sabe o que é cafetina? você tem medo das palavras?
macabéa
- sim, tenho sim."

caio fernando abreu

"você está tão forte na sua fragilidade que inventou a mim para matar a sua sede exata. nós nos inventamos um ao outro porque éramos tudo o que precisávamos para continuar vivendo."

consulta

quando alguém está fluindo o si mesmo não pode existir, catarse
toda jornada é do nada ao nada, potencialidade pura
há certa possibilidade que a mente o iluda, preguiça
uma união com a alma gêmea interior, integral
das suas profundezas às alturas, dimensões

a noite anterior

na rua um zumzumzum se ouvia
pra cima e pra baixo os passos iam e vinham
olhos perdidos à procura varriam
a amiga se despedia e pro encontro já ía
aquele, meu nome esquecia mergulhado em outra fantasia
os vizinhos barulho faziam, numa festa de sons e muita cantoria
o calor enrubescia o rosto que sorria, respondendo um olho que mira fazia
alguns um rumo certo tinham e se não, logo, adquiriam
pois, a noite ardia
era subjetivo mas todos compreendiam
o céu fervia, a lua derretia, as estrelas cadentes
eu sentia mas não me envolvia
suando, dormia

paulo leminski

"eu

quando olho nos olhos,
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora.
quem está por fora,
não segura.
um olhar que demora
de dentro do meu centro,
este poema me olha"