Na fila

Nunca serei genial
Reservo-me a desilusão
Da sinceridade

Um ano bissexto

Trezentos e sessenta e seis páginas o livro tem
completou a maior volta que poderia
alcançou em um dia a euforia

Trezentos e sessenta e seis voltas o mundo deu
alcançou o maior raio que conseguia
anunciou em uma página a valentia

Notas sobre o lago

Sempre quis ser grande.

Quase

Mesmo escancarado
múltiplos motivos esfumaçam
meu papel

a neblina desfoca o coração
e pressente a ausência
da mente que mente

Não coma

Escreva na fome
das vísceras brotam flores

Amortecida

De algodão, jeans ou linho
amor tecido

A lua girou

Teu pensar
Meu sentir
Teu chegar
Meu partir
Teu calor
Meu ventar
Teus mistérios
Meus mergulhos

Nossos encontros
...

Tu beira mar
Eu onda do mar




Fique onde estás

Não quero conselhos de torturador
- Tua voz não me calará!

Dúvidas não são túneis
elas zelam o caminhar
e da grandeza de tuas lamentações
todo amor que suplicares...

Recebo teu suspirar
Respeito teu pesar
mas:
- Vade reto pra lá!

Dê tempo?

Ah tempo! Escorregadio voa feito água e plana sem asas.
Ah vida! Bendita, erudita, dívida, inspiradora.
Ah vento! Corredor inato, escorregador de esquinas.

Poesia é desenho

Grão de areia

Já tenho um trunfo
pra sobreviver essa missão
daqueles fincados por bandeiras
essas que planam na imensidão

Dele carrego gentilezas
dessas que extrapolam o portão
grãos de areia sobre a mesa
onde compartilhamos o pão

Ansiedade

Louco desejo
necessidade incontrolável
e a vontade?

Muito tempo depois
fichas rolam pelo chão da sala
e do décimo segundo andar
escuto sonidos de lá pra cá...

Blasfêmia pouca é bobagem
pura mesmo é a sinceridade
que entra pelo vão da porta...

Incrível a sensação de implodir uma bolha
com ajuda de outra mão fixa e esfomeada.

Corre ladrão

Que se foda toda essa estrutura meritocrática que empurra, empurra, empurra. Quero mais é que tudo se exploda! Talvez assim me sinta atraída pelo brilho realizado em caos. Mereço o que? Foda-se! Não me encaixar nas suas costas quer dizer isso: não me encaixo! As migalhas que procuras não serão encontradas aqui. Dá pra entender? Qual motivo faria eu me entreter em algo tão sempre calculado? Puxo um papo imbecil sobre trabalho. Sugiro uma refeição pra conversar. Passos insuportáveis pra realizar o irrealizável. Porque o incrível é vivido em lugares inimagináveis. Preguiça de toda essa infeliz rotina machista. Como a intenção é sempre uma insensível furação com um presente indigesto, eu, na altura dos meus cabelos roxos digo: Porra nenhuma! Aqui não!

Aceita que dói menos

Mais uma batalha perdida
talvez por escolha de minhas feridas
nuvens não compõem paisagens floridas

Mais uma aventura perdida
entre as possibilidades adivinhas
frutos não amadurecem na estia

Mais uma vitória engolida
preto e branco não combinam
com necessidades mal resolvidas

Mais um lamento pro bonde multidão
entre a sofreguidão e o possível arco íris
desgastados rabiscos não compreendidos

Menos um coração batendo aguerrido
entre solidários gemidos escondidos
entre solitários gemidos escondidos

Onde não há facilidade
apedrejamos amigos
Alguém pode me explicar o por que?

Outra realidade

Me intriga
O medo a pele-tato
Compensada por tantos
Cliques não dados.

Um belo horizonte nos espera

Parece que mais uma vez teremos a trincheira no abismo
e uma mulher grávida no meio

padece mais uma vez o sentimento de gerar
a lua em mim se faz amplitude

divago e implico
e assim construo um nada revolucionário

entre estrelas e constelações
apago o afago que não veio
entre as chuvas que ainda virão.

Janela sobre o corpo

"A igreja diz: o corpo é uma culpa.
A Ciência diz: o corpo é uma máquina.
A publicidade diz: o corpo é um negócio.
O corpo diz: Eu sou uma festa."
Eduardo Galeano.

Desde antes...

Minha mãe sempre me encorajou a tomar atitudes. Desde a infância me colocou a frente na resolução das minhas vontades. Ela dizia: Você quer saber? Então vá perguntar. Te espero aqui. E mantinha-se a observar de longe minha empreitada. Saber dela na minha retaguarda me encorajava e empoderava. Algumas vezes me causava revolta porque comparando-a com as mães de algumas colegas, lamentava que ela fosse assim. Hoje sei que essa sua postura foi parte fundamental da minha formação como mulher diante um mundo machista. Minha base fortalecida desde a infância não permite que eu me cale diante de injustiças. Meu pai? Como me ajudou nessa construção? Ele nunca disse nada. E ainda acredito que se ele estivesse presente, atrapalharia. Hoje eu sei disso, naquela época lamentava sua ausência.

Uma carta

Os futuros amores não conhecem as dores que trazem as cores.

Se arriscam em vôos de intensos calores que queimam frio por dentro.

Nas ondas dessas nuvens não se sabe a profundidade dos sabores.

As flexões laterais de quadris magistrais serão as lembranças que esquecerás.

Cabe marcar as estrelas que souberam encontrar o delicado e único sentido de acariciar.

No fundo

Visitar esse passado de angustias
inquieta minha alma
a incerteza traiçoeira
acompanha meus mergulhos

As escolhas emocionais
sempre são minhas escolhas
as palavras entaladas
não mais

A disponibilidade pros que amo
convertida em cobranças
que sei não serem supérfluas
É de troca que preciso!

Compartilhar no olhar e no abraço
é o que mais quero
e palavras pra guardar
e racionalizar quando preciso

Já não busco a deriva dos carinhos
desejos não satisfazem minhas necessidades
o mar penetra as areais bem a fundo
e purifica a salvação

Meu corpo, meu jardim!



A casa

O mundo visitou a minha casa!
O mundo conheceu minha casa!

As paredes altas
revertem as luzes em sombras
e eternizam o ambiente.

As aberturas escancaradas
refletem em brilhos as sombras
e abrigam dissidentes.

Meus túneis em suas terras,
Suas terras em meus túneis.

Minha casa no mundo,
O mundo concebeu!


Muro

Quando grito, grito!
Grito porque muro.
Grito porque voz.

Alguém

Chance, oportunidade - qualidade de oportuno, ocasião favorável. Ocasião oportuna, que vem a tempo, a propósito, apropriado. Oportunidade para a realização, momento, circunstância - ocasião, situação - estado ou condição em dado momento, particularidade que acompanha um fato. Circunstancial, relativo ou resultante do tempo, a sucessão dos anos, dias, horas, que envolve a noção de presente, passado e futuro. Momento ou ocasião apropriada para que uma coisa se realize. Época, estação. As condições meteorológicas. Vontade, faculdade de representar mentalmente um ato que pode ser ou não praticado em obediência a um impulso ou a motivos ditados pela razão. Sentimento que incita alguém a atingir o fim que essa faculdade propõe. Capacidade de escolha, de decisão. Firmeza. Capricho. Desejo ou determinação expressa. Necessidade fisiológica. À vontade, sem constrangimento, sem peias. Voragem, aquilo que sorve ou devora. Turbilhão, tudo que subverte ou consome. Último, que está ou vem ao final. Um. Designa pessoa, animal ou coisa de modo impreciso, vago. Algum, qualquer, quando certo e determinado, singular e único. Uma pessoa, alguém. Eu.

Trinta e três

Conteúdo turvo
Abstratas possibilidades
Oportunidades escassas
Borbulhante vontade

Caminhos obstáculos
Congruentes dizeres
Fazeres reciclados
Voluntária ação

Pesares aliviados
Decifrados gostares
Pisares amaciados
Adocicada bebida

Volupias intensificadas
Esfumaçadas posturas
Vozes emolduradas
Transformadora comida

Ilusão

Alivia-lhe o peito acomodado.
Por saber-me em casa.
Ele na sua e eu na minha.
Essa mente prisão alegra-lhe o coração.
Uma tortura vigília.
Macha convicção.
Autopunitiva.

Cecília Meireles

Colar de Carolina

"Com seu colar de coral,
Carolina
corre por entre as colunas
da colina.

O colar de Carolina
colore o colo de cal,
torna corada a menina.

E o sol, vendo aquela cor
do colar de Carolina,
põe coroas de coral
nas colunas da colina."

O mundo


Nossas mãos se perdem
Enroscam cabelos e identidades
Memórias emolduradas por pálpebras semicerradas.

Separo de mim as datas ditosas
Guardo as citações inspiradoras
Esculpo um tempo desconexo:
entre o sonho e o tato.

Espero teu sono duradouro
Afrouxo o fiar do vento
Faço a brisa soprar remos
e nado feito peixe.

Adorno meu mergulho em lençóis
Transbordam flores das encostas: tuas costas
e entre labaredas reveladas pelo cheiro. Te durmo.

Sei das voltas das águas
dos tremores das terras
dos embalos dos ventos
da estrela da manhã...

Não preciso de ninguém, mas quero.
Grande e robusto como nossos pés.
Criar e depois ser consciência:
insensatez e delicadeza.

(vejo elefantes a pisarem fundo
no equilíbrio lento da cadência infinita)

Chuva

O tédio que produzo
seria menos tedioso
se sem culpa.

Já foi e não é mais

Num rebanho de burros
O primeiro a levantar a orelha
Diz o nome do infortúnio.
Já o segundo
Entre tropeços e murmúrios
Grita em nome do justo.
O rebelde logo atrás
Em meio a poeira fugaz
Não hesita, nem silencia
Fincado a bandeiras que arrastam
O fim de um mundo.

Fruta madura

Caminhávamos com zelo
Pelo valioso caminho, pele
Respeito e impasse, ação.

Desapego redentor e benção-dor
As flores colorem mesmo murchas.

Desabrochar martírios, não
Existe outra razão pra podar e colher
Sentimentos não são assim
Faça-os crescer.

Atenção coração, o zelo é irmão
E sabe como também os bebês
Que não passa do chão.

Abre e cava, está aí, podes crer
Você consegue se deixar
Florescer, ser antes de ter.

Pele

De frente mirei sobre-------passando os olhos refletidos
além buscava o que ainda não compreendia
não via Dalí, porém comporia aquele quadro.


A tinta escorria guiada por sinos, assovios da mata:
verde malta arrancada no romper das unhas!
suada pelugem enraizada, brotada do olhar.


Nova marca de água, meus chakras escancarados
caneta riscada excedida de linhas óbvias
um brilho pena-------folha tão meu quanto seu.

Silencia?

um chiado gritado
do alto cantado...


em terras vis

vive bem quem é surdo
e tem a língua presa.

Eureca

E a questão agora é encarar-se como o seu sonho realizando-se em si mesma.

Bom dia!

Com os peitos na mesa
encarei aquele homem
escondido na altivez velhaca
que carregam os conformados.

Indaguei com ousadia
sua postura endurecida
parecida a troféus inúteis
exibidos em prateleiras.

Confrontei seus versos sacis
com a paranóia criada
a partir de homônimos
correndo de dentro de mim.

Busquei em seus bolsos
alguma poeira levantada
que me fizesse acreditar
que ele tinha tentado sair dalí.

Estendi minha mão esquerda
estiquei a manga lateral direita
e propuz uma trégua vermelha
pra que brotasse a flor.

Já que o tempo passa...
E a mão esticada dói...

Decidi me levantar
e apliquei a última cartada
sem seu mísero consentimento
explodi meu gozo na sua cara apática
embalado por ecos
de cantos vindos de longe.


Polidez desnecessária

Rasgar o azul que tudo envolve
Explodir o amarelo que tudo vê
Mergulhar no branco que tudo dissolve
Borbulhar no preto que tudo sê

Sombras não encobrirão
o fervor do amor.